Trinta e três anos depois de 21 anos de Ditadura Militar no Brasil, o mundo assiste a uma possível transição de regime que, contrariamente ao que se deu em 1964, edifica-se por uma transição legal para a ditadura.
Uma transição que se semeou em 2016 com a destituição da legítima Presidente do Brasil Dilma Rousseff e criou raízes com a negação do direito, direito reivindicado também pelo Comité de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, por parte do Tribunal Superior Eleitoral, da candidatura de Lula da Silva, ex-presidente do Brasil, que liderava a intenção de voto, meses antes das eleições.
Um mês depois da celebração de mais um ano da Proclamação da Independência do Brasil, no passado dia 7 de outubro de 2018, viveu-se um dia de luto internacional mascarado de verde e amarelo. Nas eleições presidenciais brasileiras o candidato da extrema-direita, Jair Bolsonaro, do Partido Social Liberal, liderou a eleição com 46% da votação, seguido da segunda mais votada candidatura com 29,3% da votação de Fernando Haddad do Partido dos Trabalhadores.
Verificou-se uma polaridade eleitoral, com os Estados do Nordeste, estados com menor índice de desenvolvimento humano e com maior número de beneficiários do Bolsa Família (programa financeiro de apoio a famílias mais carenciadas) a votarem maioritariamente em Haddad, impedindo que tudo ficasse definido na 1ª volta e garantindo assim a necessidade de uma segunda votação, que se realizará no próximo dia 28 de outubro.
O confronto travar-se-á entre um mestre e professor de economia e Bolsonaro que assume nada perceber sobre este tema; entre um compromisso de isentar o imposto de renda, a quem recebe até cinco ordenados mínimos, e a intenção de aumentar esta mesma renda; entre quem apresenta políticas várias contra a violência e quem quer banalizar o porte de arma, entre Haddad que defende a necessidade de políticas de combate à violação e de promoção da saúde integral da mulher e Bolsonaro que defende a proibição da Interrupção Voluntária da Gravidez em caso de violações; entre um candidato que defende a igualdade profissional e salarial e quem levianamente afirma que “as mulheres devem ganhar menos porque engravidam”...
No país que se rege pela Ordem e Progresso, a maioria dos eleitores mostrou preferência na escolha para Chefe de Estado de alguém que se manifesta a favor da tortura, que levianamente insinua violações sexuais, que defende massacres militares, que despreza as diversas identidades de género e orientações sexuais e que fomenta a violência e o desrespeito pelas mulheres e minorias. Um candidato cuja campanha eleitoral se pautou de ataques pessoais, de ofensa à liberdade individual, de proclamação da submissão das minorias face às maiorias e que proliferou tantas notícias falsas. O mundo, nestes últimos meses tem assistido a uma nova novela brasileira em que o protagonista edifica o seu monólogo sobre as vozes abafadas dos actores que ele exige que sejam secundários.Que motivos levarão a que conscientemente se defenda um candidato com esta postura? Será justificação suficiente um descrédito pela Democracia ou estará o povo brasileiro tão alienado que não enxerga as reais e possíveis consequências do seu voto?
É um sinal de alerta mundial, quando está iminente a eleição de um político autoritário, racista, machista, homofóbico, proclamador de um discurso de incentivo ao ódio, um adorador da ditadura e defensor dos valores mais retrógrados, para o cargo de Presidente de um dos maiores Países, tão rico em recursos naturais como culturalmente.
É um sinal de alerta para nós europeus, que em paralelo com o crescente movimento global nacionalista que já conquistou os Estados Unidos da América e marcha agora pelo coração da América Latina, assistimos a um ganhar terreno da extrema-direita na Europa. Desta expansão, é exemplo o apelo dos líderes da extrema-direita italiana Matteo Salvini, e francesa, Marine Le Pen, de criação de uma “frente da liberdade” de partidos soberanistas, no início do mês de outubro, no mesmo dia em que apresentaram juntos a campanha eleitoral para as Eleições Europeias que se realizará no próximo dia 23 de maio.
As próximas semanas serão decisivas para a História da Democracia no Brasil e no Mundo. Mais do que estarmos perante a eleição de um candidato em particular, estamos perante a não eleição de alguém que pode fazer retroceder na história séculos de progresso social. Que todos os cidadãos conscientes e todos os outros candidatos à presidência se unam e consigam fazer ouvir o Grito que há 196 anos criou tormentas nas calmas águas do riacho do Ipiranga.
Eva Borges, 4ºano
Ilustração por Ricardo Sá, 4º ano