Contextualização: introdução da problemática
Com quase 40 anos, o Serviço Nacional de Saúde tem vindo a mostrar o seu valor na oferta de cuidados de uma forma universal. Contudo, existem muitas questões que se prendem com a sua acessibilidade e equidade. É neste sentido que se torna de maior importância a sua gestão equilibrada através de políticas de saúde e, de uma forma mais particular, a gestão adequada das instituições de saúde e do seu financimento.
Tomando isto como ponto de partida, apercebemo-nos das perspetivas divergentes que podem surgir neste contexto. De um lado, existe o Estado como entidade reguladora, função à qual acresce a responsabilidade pela alocação de recursos que permitam um olhar para o futuro, para uma população com melhores indicadores de saúde. Num outro, as Administrações das Unidades de Saúde, que pretendem eficácia e eficiência, procurando gerir o seu orçamento na tentativa de prestar melhores cuidados. Por último, a população, que é a razão pela qual todos iremos trabalhar, e que muitas vezes acaba por ser esquecida, que pretende ver as suas expetativas satisfeitas, independentemente dos gastos que estas representam.
Sendo assim, este texto surge como uma tentativa de consciencialização para a realidade vivida na saúde em Portugal, contexto este que teremos de enfrentar a partir do momento em que passarmos a constituir uma equipa clínica ou, de forma alternativa, encararmos esta temática de um ponto de vista mais macro, por via da saúde pública.
Níveis de gestão
Em saúde, distinguem-se três patamares de gestão: Políticas de Saúde, Unidades de Saúde e Clínica.
Com certeza, percebemos a diferença que podemos fazer ao nível da clínica. Melhores decisões logísticas e terapêuticas terão de ser tomadas no sentido de garantir um benefício individual para o doente que se encontra diante de nós. Ainda assim, não podemos obliviar as necessidades de todos os outros doentes que esperam por tratamentos semelhantes. Assim, a nossa obrigação é ter conhecimento, do ponto de vista financeiro, do que representa cada ato médico, e ponderá-lo cada vez que o prescrevemos (embora se possam questionar se isto não nos desvia da conceção puramente médica da medicina).
Contudo, numa alternativa não muito explorada, existe a possibilidade de fazer a diferença a um outro nível. Os cargos de administração hospitalar tendem a ser ocupados por profissionais com formação de base em gestão. Todavia, é clara a falta da componente médica nos seus currículos. Neste sentido, perguntamo-nos (ou eu pergunto-me) de que forma pode existir gestão em saúde sem o conhecimento do valor do doente, das suas necessidades reais.
Por outro lado, o mesmo seria contestado se um médico ocupasse estes lugares sem que tivesse em sua posse conhecimento dos princípios básicos de economia ou gestão.
Masters in Business Administration (MBA) como formação complementar
É desta forma que introduzo uma possibilidade no percurso académico de um estudante de Medicina.
Nos Estados Unidos da América, são cada vez mais as universidades com esta preocupação, e é com isto que justificam a criação de um double-degree que combina, ao longo de cinco anos, o curso de Medicina e um MBA.
A ideia por detrás deste conceito não seria que os médicos se afastassem da prática clínica. Ao invés disso, seria uma tentativa de capacitar o profissional de saúde a lidar com os aspetos económicos que se relacionam com a sua carreira. Ainda assim, muitos são os que decidem subir na escada de tomada de decisão e procurar um lugar no executivo das instituições de saúde.
Infelizmente, um entrave é colocado no contexto português. Não existe nenhuma instituição que ofereça esta formação conjunta, o que obriga à difícil tarefa de conciliar os dois cursos ou, em alternativa, a sua realização em diferido. Apesar de tudo, esta é uma decisão que vem a ser tomada por um crescente número de profissionais de saúde, que veem esta possibilidade como um meio de alcançar novas oportunidades no mundo do trabalho.
Perspetivas e Considerações Finais
A admissão do médico na gestão é um passo importante e com ele espera-se uma modificação nos princípios de organização e gestão dos serviços em saúde, colocando o doente como ponto central de um sistema, atualmente focado em números e no retorno do investimento.
Embora esta atitude possa parecer um desfoque do papel estritamente médico, os estudos que têm vindo a ser feitos apontam para uma melhoria dos cuidados de saúde quando as cadeiras nos conselhos de administração são partilhadas com médicos-gestores. E é com esta perspetiva que iremos avançar, de forma a tornar o Serviço Nacional de Saúde um sistema cada vez mais eficaz, almejando a perfeição inatingível que caracteriza a sempre insatisfeita espécie humana.
Miguel Palas, 4º Ano
Ilustração por Ricardo Sá, 4º ano