Quando era pequena
Quando era pequena e precisava de ir ao hospital, a minha mãe vinha sempre comigo. Ficávamos na sala de espera, eu bastante entretida com brincadeiras e miminhos.
Ia para a triagem. A minha mãe ajudava-me a explicar os meus sintomas. Na verdade eu olhava para ela e ela verbalizava o que eu sentia.
Na entrada para o consultório agradecia sempre aos céus por a minha mãe ir comigo. Não tinha medo da bata branca. Mas o ambiente em si era-me estranho. Só que a minha mãe era tão familiar que o estranho se tornava menos estranho. Depois íamos à farmácia e ela encarregava-se que eu tomasse tudo direitinho. Primeiro os xaropes deliciosos (nunca se esquece o sabor do brufen!) e depois dos comprimidos. Recordo-me da primeira vez que engoli um Ben-u-Ron. Tomava-me como crescida, um grande passo para a minha pessoa! Mal senti aquela bola desconfortável a arranhar-me a garganta, perguntei à minha mãe onde estava o xarope.
Ao longo dos anos, quando recorria ao Serviço de Urgência, sentia-me cada vez mais crescida, cada vez mais capaz de me explicar por mim própria. Mas a minha mãe ia sempre comigo.
Até que um dia, fiquei tão adulta que disseram: "A menina já está muito crescida, tem que entrar sozinha".
Lá entrei, sabia que estaria sempre bem. Porque a minha mãe estava lá fora, à minha espera.
Um dia, às 4 da manhã, tive uma crise renal tão aguda que depois de vomitar e ficar esverdeada, a minha mãe levou-me às urgências. A enfermeira impôs que como já era crescida tinha que ficar sozinha a passar lá a noite. A minha mãe, com a serenidade que a caracteriza, perguntou-me o que preferia. Eu sabia que já era grande! Em breve ia fazer os exames nacionais do 11º ano. E sabia que qualquer dor era suportável, com os mimos da minha mãe. Pedi-lhe que ficasse. Sem questionar, ela disse à senhora enfermeira que eu queria a sua companhia. A enfermeira disse que isso não tinha jeito nenhum, que então não podia ficar na maca, que ficava na cadeira, já que queria tanto a minha mãe. E a minha mãe, como qualquer mãe, conseguiu que eu ficasse na maca e com uma cadeira ao lado na qual ela se sentaria a passar o resto da noite comigo.
Ontem, no 3º ano de medicina, fui levar a primeira dose da vacina para a Covid-19. Fui chamada para uma dose que restava então fui diretamente para uma sala de espera no centro de saúde. E ao meu lado?
Ao meu lado estava a minha mãe, com a serenidade que a caracteriza, a dar-me a mão e os seus mimos.
Sei que um dia serei demasiado crescida para a minha mãe não me poder fazer mais companhia na espera do hospital.
Mas hoje?
Hoje sou dela como ela é minha.
Porque será sempre minha mãe e eu serei sempre sua filha.
Autoria: Carolina Malta Gomes
Edição de Imagem: Catarina Simões